Em debate sobre candidaturas avulsas, Janaina Paschoal diz que partidos políticos se unem e legislam com a intenção se perpetuar no poder

O Supremo Tribunal Federal (STF) discutiu na tarde desta segunda-feira (9) a possibilidade de um cidadão disputar eleições sem filiação partidária, as chamadas candidaturas avulsas ou independentes, hoje barradas pela Constituição.

Marcaram presença na reunião membros do Congresso Nacional e representantes de movimentos civis e acadêmicos.

Quem convocou a audiência e conduziu o debate foi o ministro Luís Roberto Barroso, relator de um recurso extraordinário sobre candidaturas avulsas, interposto pelo advogado Rodrigo Mezzomo.

Pré-candidato à Prefeitura do Rio de Janeiro em 2016 , Mezzomo teve sua candidatura negada pela Justiça Eleitoral por não ser filiado a nenhum partido.

Além do STF, o advogado também recorreu à Organização dos Estados Americanos (OEA), alegando que sua candidatura deveria ser aceita, uma vez que o Brasil é signatário da Convenção Americana de Direitos Humanos, que não exige filiação partidária como requisito para se candidatar.

Uma das figuras centrais do processo de impeachment e professora da faculdade de direito da USP, a deputada estadual Janaína Paschoal (PSL-SP) foi a primeira a ser ouvida na audiência. A escolha, segundo o relator, se deu devido ao fato de ser a deputada mais votada do Brasil.

Janaína se declarou a favor das candidaturas individuais sob a justificativa de que os partidos políticos se unem e legislam com a intenção se perpetuar no poder e “para asfixiarem qualquer indivíduo ou qualquer grupo livre que tente se estabelecer ou estabelecer uma ideia diferente”.

“A ministra Cármen Lúcia diz que voto é poder. Mas como exercer livremente esse poder se entre o eleitor e o candidato existe um cartel? Como exercer livremente esse poder se este cartel impõe esses candidatos?”, disse ela.

Paschoal salientou que não defende a extinção dos partidos e ao contrário disso, acredita que a liberação de candidaturas individuais pode fortalecer as legendas e forçá-las a se aprimorarem. “Vejo que a concorrência pode forçar os partidos a se aprimorarem, eles se fortalecerão e assim teremos efetivamente uma república”, declarou.

Representando o Partido dos Trabalhadores, o deputado federal Paulo Teixeira (PT) discursou contra a medida. Seu argumento foi que o sistema político brasileiro acentua aspectos personalistas, enquanto desvaloriza programas e pessoas. “A admissão da candidatura avulsa, na minha opinião, vai acentuar esse [personalismo] que é um dos vícios do sistema político”, disse.

Paulo Teixeira lembrou ainda que a legislação vigente reserva 30% das candidaturas às mulheres, e que a aprovação desta medida poderia se tornar um impasse nas políticas de igualdade de gênero do sistema político brasileiro.

“Como nós faremos se nós admitirmos as candidaturas avulsas se todas forem masculinas? Nós estaríamos indo em direção oposta aquela que nós desejamos de igualdade na posição dentro dos parlamentos entre homens e mulheres”, afirmou.

A audiência pública é o primeiro passo no processo de análise do recurso no STF. No início da sessão, Barroso afirmou que ainda não tem posicionamento definido sobre o tema.

“A posição deste tribunal, ou pelo menos deste relator neste momento é nenhuma. Portanto meu papel aqui verdadeiramente é vazio de convicções prévias”, disse.

O ministro afirmou que deve ter seu voto até junho de 2020, e assim, leve o recurso para ser apreciado no plenário da Corte.

Proposta

Desde 2008 uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) sobre candidaturas aguarda para ser votada na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara. Desde então, outras com a mesma finalidade foram apresentadas, mas também não avançaram para o plenário.

A mais recente é de autoria do deputado João Derly (REDE-RS), apensada na PEC anterior. O relator das propostas é o deputado Luiz Philippe de Orleans e Bragança (PSL-SP), favorável às candidaturas independentes.

O deputado participou da audiência, onde afirmou que considera haver falta de conexão, vínculo e representatividade entre a população e as legendas. Para Orleans e Bragança, o Brasil corre o risco de viver uma oligarquia de partidos políticos, onde estes criam leis para se proteger e, assim, se tornarem instituições soberanas.

“Estamos aqui com o risco sério de cair numa ditadura partidária. Num fechamento completo do sistema político dominado com caciques endinheirados sem nenhum compromisso com a democratização dos partidos”, disse.

Relator da PEC das candidaturas individuais, ele reforça que elas são essenciais para o estado de direito, além de fortalecerem os partidos na medida que os tornariam mais representativos.

Para que a proposta avance para o plenário da Câmara, é necessário a votação na CCJ, além da análise em comissões especiais, onde será tema de discussão mais aprofundada.

Mundo

A grande maioria dos países que adotam a democracia como sistema político já aceitam candidaturas individuais.

De acordo com o projeto intergovernamental ACE, em junho de 2017, quando o caso de Mezzomo chegou ao Supremo, apenas 21 países exigiam que candidatos estivessem vinculados a partidos políticos para concorrer a cargos eletivos.

Além do Brasil, também fazem parte da lista a Argentina, Uruguai, África do Sul, Suécia, Nigéria, entre outros.

Fonte: Exame

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