Janaína Paschoal fala do voto de Gilmar Mendes e outras questões atuais

Por: Paulo Ghiraldelli

Entrevista rápida com Janaína Paschoal.

Paulo Ghiraldelli (PG). O voto de Gilmar Mendes pela soltura de José Dirceu foi um voto declaradamente não técnico, inclusive citando os procuradores. Você concorda? Se sim, não há nada que a sociedade possa fazer nesse caso?

Janaína Paschoal (JP). Vamos por partes. Eu não diria que o voto foi declaradamente não técnico. O voto foi manifestamente contrário à jurisprudência do próprio Supremo Tribunal Federal e dos demais Tribunais do país. Em todas as Cortes, ao manter prisões preventivas, os magistrados consideram a gravidade dos fatos em concreto, consideram o fato de haver várias condenações e ações em andamento, consideram o fato de o sujeito ter mantido a prática criminosa, enquanto respondiam a uma ação penal. Nos casos dos liberados nos últimos dias, tudo isso foi desconsiderado. Veja que eu não estou apenas comparando com os milhares de presos provisórios, que não chegam ao STF. Estou comparando com a situação daqueles que conseguem levar seus casos ao STF e são mantidos presos. Para quem trabalha com Direito, o quadro que se apresenta é muito triste, sobretudo porque as pessoas agraciadas com as decisões fizeram parte de um grande saque ao país.

PG. Antes mesmo da imprensa falar algo sobre o assunto, senti e escrevi que o voto do triunvirato que soltou Dirceu visava antes conter Palloci na delação premiada que qualquer outra coisa. E deu certo. Você sente mesmo um complô nesse sentido?

JP. Prefiro não utilizar a palavra complô. Mas é impossível negar que há uma pressa em soltar os presos da Lavajato. Na medida em que os figurões de todos os Partidos já apareceram nas delações, é possível pensar que há delações envolvendo pessoas poderosas ainda não expostas. Resta saber quem.

PG. No jogo de braço entre Lava Jato e os políticos, há algo técnico que se possa fazer? Ou ficamos à mercê do simples “povo na rua”?

JP. Não acho que povo na rua resolva o problema agora. Magistrados não dependem de voto. Cabe à Procuradoria Geral da República arguir os impedimentos e suspeições dos Ministros que vêm concedendo liberdade, sem darem maiores explicações.

PG. Há como trabalhar ainda com alguém no Congresso, no Senado, ou o sistema está contaminado a ponto de ficarmos sozinhos, ou seja, a população entregue a si mesma?

JP. Eu acredito que há pessoas bem intencionadas em todos os lugares, não gosto de generalizações, nem para endeusar, nem para demonizar.

PG. Uma pergunta um pouco fora do eixo: a decepção com Temer veio cedo, e não era mesmo para termos confiança; mas e o Dória, já não começa a repetir embates ideológicos desnecessários? Não há uma picuinha ideológica que ele não esquece, contra Lula etc.?

JP. Ainda estou observando o novo Prefeito. Difícil saber até que ponto seu discurso anti-Lula é sentido mesmo, ou se foi adotado pela oportunidade política. Espero que seja um discurso real. Lula, e tudo que ele representa, precisa ser firmemente combatido.

PG. Como você vê as reformas da previdência e trabalhista? Não há uma afronta aos sindicatos que nos leva para um Brasil que perturba demais a justiça do trabalho? Não é algo que pode levar nossa democracia liberal para um campo de fim do início do século XX, na República Velha?

JP. Veja, acho que esse governo, até por todas as denúncias que há contra ministros, têm dificuldades para dialogar com a população, para explicar que é necessário fazer reformas, até para garantir a aposentadoria dos mais necessitados. Hoje, há muito discrepância e regalias. O governo ganharia crédito se começasse cortando os mega-salários, em todos os poderes. Ganharia crédito se as autoridades, que têm duas aposentadorias, para dar o exemplo, já abrissem mão de uma delas. As pessoas estão incrédulas e é compreensível!

Fonte: Paulo Ghiraldelli

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